1) O primeiro argumento é a necessidade de explicar "castigo eterno" de Mateus 25:46, que está
diretamente relacionado com "vida eterna", sem que traga necessariamente a implicação de
eternidade. Admitindo-se que, como é corretamente defendido, "eterno"(aionios) no Novo
Testamento significa "que pertence à era porvir" em vez de expressar qualquer noção diretamente
cronológica, os escritores do Novo Testamento são unânimes em concluir que o tempo porvir será
eterno. Então o problema dos aniquilacionistas permanece no mesmo lugar que estava. A afirmação
de que, na era por vir, a vida é alguma coisa contínua, enquanto que o castigo é algo com um final,
torna a questão evasiva. Basil Atkinson, "um excêntrico bacharel acadêmico", de acordo com
Wenham28, mas um filologista profissional, e mentor de Wenham e Stott nessa matéria, escreveu: "Quando o adjetivo aionios significando "eterno" é usado no grego juntamente com substantivos de
ação, ele se refere ao resultado da ação, não ao processo. Assim a expressão "castigo eterno" é
comparável a "redenção eterna" e a "salvação eterna", todas expressões bíblicas ... os que se perdem
não passarão eternamente por um processo de castigo mas serão punidos uma vez por todas com
resultados eternos."29 Embora essa declaração seja constantemente feita por aniquilacionistas, que de outra maneira não
poderiam erigir sua posição, ela carece de apoio gramatical e em qualquer caso torna a questão
evasiva quando assume que o castigo é um evento momentâneo ao invés de contínuo. Embora,
porventura, não seja absolutamente impossível, o raciocínio parece artificial, evasivo, e, em uma
avaliação final, desamparado. 2) O segundo argumento é que, uma vez que a idéia de imortalidade intrínseca da alma (isto é, do
indivíduo consciente) deixa de ser considerada como uma intromissão platônica na exegese do
segundo século, parecerá que o único significado natural de morte, destruição, fogo e trevas no Novo
Testamento como indicadores do destino dos ímpios é de que tais pessoas deixam de existir. Mas tal
afirmação quando submetida à prova mostra estar errada. Para os evangélicos, a analogia das
Escrituras, isto é, o axioma da sua coerência e consistência intrínsecas e sua capacidade de elucidar
ela mesma os seus ensinos, é uma regra para toda interpretação, e, embora haja textos que,
tomando-os isoladamente, podem conter implicações aniquilacionistas, há outros que de forma alguma
podem se encaixar nesse esquema. Mas nenhuma teoria que se propõe a explicar o significado da
Bíblia e não abrange todas as Suas principais declarações pode ser verdadeira. Judas 6 e Mateus 8:12; 22:13, 25:30 mostram que as trevas significam um estado de privação e
aflição, mas não de destruição no sentido de deixar de existir. Somente aqueles que existem podem
chorar e ranger seus dentes, como é dito dos que serão lançados nas trevas. Em nenhuma parte a morte significa extinção; morte física é a partida para outra forma de existência
chamada sheol ou hades, e morte metafórica é uma existência sem Deus e Sua graça; nada na
terminologia bíblica garante a idéia, encontrada em Guillebaud30 e outros, de que "a segunda morte"
de Apocalipse 21:11, 20:14, 21:8 significa ou refere-se à extinção da existência. Lucas 16:22-24 nos mostra, como também uma grande quantidade de linguagem apocalíptica
extra-bíblica, que fogo significa uma existência continuamente em tormento, e as arrepiantes palavras
de Apocalipse 14:10, 19:20, 20:10 e de Mateus 13:42,50 confirmam isso. Em 2 Tessalonicenses 1:9 Paulo explica, ou amplia, o significado de "sofrerão penalidade de eterna
(aionios) destruição" adicionando "banidos da face do Senhor" __ expressão que, por denotar
exclusão, joga por terra a idéia de que "destruição" significa extinção. Somente aqueles que existem
podem ser excluídos. Tem sido freqüentemente demonstrado que no grego o significado natural das
palavras relacionadas a destruição (substantivo, olethros; verbo, apollumi) é arruinar, de forma que o
foi destruído fica, a partir de então, inutilizado, ao invés de propriamente aniquilado, de maneira que
passa a não mais existir de forma alguma. Os aniquilacionistas se defendem com especial argumentação. Às vezes, eles argumentam que tais
textos que falam de um tormento contínuo fazem referência somente a uma experiência temporária
para os que se perdem antes de deixarem de existir, mas isso é tornar a questão evasiva através de
uma exegese especulativa e renunciar a sua declaração original de que o Novo Testamento, quando
fala de perdição eterna, sugere naturalmente a extinção. Peterson cita John Stott, no que ele chama de
"o melhor argumento aniquilacionista"31. O trecho a seguir faz comentários às palavras "A fumaça do
seu tormento sobe pelos séculos dos séculos" de Apocalipse 14:11. O próprio fogo é chamado "eterno" e "inextinguível", mas seria muito estranho se o que fosse ali
atirado provasse ser indestrutível. A nossa expectativa deveria ser o oposto: o que for ali atirado deve
ser consumido eternamente, não atormentado eternamente. Por isso existe a fumaça (evidência de que
o fogo fez o seu trabalho) que "sobe pelos séculos dos séculos". "Pelo contrário", contra-argumenta Peterson, "nossa expectativa seria de que a fumaça se extinguiria
uma vez que o fogo já tivesse terminado o seu serviço ... O restante do verso confirma nossa
interpretação: "e não têm descanso algum, nem de dia nem de noite, os adoradores da besta e da sua
imagem"32. Para isso parece não haver resposta. Portanto, o argumento lingüístico fracassa em todos os seus pontos. Dizer que alguns textos, tomados
isoladamente, poderiam significar a aniquilação, não prova absolutamente nada quando outros
evidentemente não o fazem. 3) O terceiro argumento é o de que o fato de Deus aplicar eternamente um castigo aos perdidos seria
algo injusto e desproporcional. Stott escreve: "eu questiono se o 'tormento eterno e consciente' é
compatível com a revelação bíblica de justiça divina, a menos que talvez (como tem sido
argumentado) a impenitência dos ímpios também perdure ao longo da eternidade"33. A incerteza
expressa pelo "talvez" de Stott é estranha, por isso não há nenhuma razão para se pensar que a
ressurreição dos ímpios mudará o seu caráter, e sim toda a razão para se supor que a sua rebeldia e
impenitência continuarão enquanto eles existirem, tornando o eterno exílio da comunhão de Deus
plenamente apropriado; mas, deixando isso a parte, é evidente que o argumento, se fosse válido,
provaria coisas demais e terminaria solapando a própria causa aniquilacionista. Mas se, como sugere o argumento, é desnecessariamente cruel para Deus manter os que se perdem
existindo para serem atormentados, porque a Sua justiça no caso não requer isso, como os
aniquilacionistas podem justificar, em termos da justiça de Deus, o fato dEle os fazer passar por
qualquer tipo de tormento após a morte. Por que a justiça, que desse ponto de vista requer a
aniquilação de qualquer forma, não se satisfaz com uma aniquilação no momento da morte? Os
aniquilacionistas bíblicos, que não podem escapar da expectativa bíblica da ressurreição final de
crentes e incrédulos para o julgamento, também admitem que haverá alguma dor imposta após o
julgamento e antes da extinção; mas se a justiça de Deus não requer nada além da aniquilação, e
portanto não requer essa dor, ela se torna uma crueldade desnecessária, sendo Deus assim,
conseqüentemente, acusado de cometer a mesma falta da qual os aniquilacionistas ansiosamente
querem provar que Ele é inocente e também condenam a corrente principal do pensamento cristão
por sua inferência. Enquanto que, se a justiça de Deus realmente não requer nenhuma punição em
adição à aniquilação, e a contínua hostilidade, rebeldia e impenitência dos ímpios para com Deus
permanece uma realidade após suas mortes, não haverá momento algum em que seja possível tanto
para Deus como para o homem dizer que castigo suficiente já foi aplicado, que já não merecem mais
do que já receberam, e qualquer punição a mais além disso seria injusta. Dessa forma o argumento
retorna aos seus proponentes como um bumerangue, impelindo-os de volta e deixando-os sem poder
escapar das garras do seu dilema. Basil Atkinson foi mais sábio e declarou: "eu tenho evitado ...
qualquer argumento sobre o estado final dos ímpios baseado no caráter de Deus, o que eu
consideraria uma irreverência tentar avaliá-lo"34. Sem dúvida ele anteviu as dificuldades a que tal
argumento conduz. 4) O quarto argumento é o de que a alegria dos santos no céu seria arruinada pelo fato de saberem
que alguns continuam debaixo de merecida punição. Mas não se pode dizer isso de Deus, como se a
manifestação da Sua santidade na punição doesse mais a Ele do que aos ofensores; e desde que no
céu os cristãos serão semelhantes a Deus, amando o que Ele ama e se regozijando em toda
manifestação Sua, incluindo a manifestação da Sua justiça (na qual os santos, pelas Escrituras, na
verdade já se alegram neste mundo), não há razão para imaginar que a sua alegria eterna será
prejudicada dessa forma35. É desagradável contestar honrados colegas através de uma matéria impressa, alguns dos
quais são bons amigos e outros agora já se
encontram com Cristo. Portanto, paro por aqui. Meu propósito era apenas reconsiderar o debate e
avaliar a força dos argumentos utilizados, e isso eu fiz. Eu não estou certo se concordo com Peter
Toon quando diz que "discussão sobre se o inferno significa castigo eterno ou aniquilação após o juízo
... é tanto perda de tempo como uma tentativa de saber daquilo que não podemos saber"36, mas eu
estou convencido de que ele está certo em dizer que o inferno "faz parte do Evangelho" e que
"advertir as pessoas para que evitem o inferno significa que ele é uma realidade"37. Todo aquele que
se decide por advertir as pessoas para que evitem o inferno pode andar em comunhão no seu
ministério e legitimamente reivindicar ser um evangélico. Quando John Stott argumenta que "a
aniquilação final do ímpio deveria ser aceita como uma alternativa legítima e biblicamente
fundamentada para o eterno e consciente tormento"38, ele pede demais, pois os fundamentos bíblicos
dessa posição, quando examinados, provam, como vimos, que são inadequados. Seria errado porém,
se essas diferenças de opinião quanto ao assunto levassem ao rompimento da comunhão. Entretanto
seria uma boa coisa se elas fossem resolvidas. Notas: 28 Wenham, Universalism ... (Universalismo...), 162, note 3. 29 Atkinson, Life and lmmortality (Vida e Imortalidade), 101. 30 H. E. Guillebaud, The Righteous Judge (O Justo Juiz), 14. 31 Peterson, Hell on Trial (Inferno em Julgamento), 162. Wenham descreve as páginas de Stott como
um "tratamento leve", (Universalism. . ., 167). O julgamento de Peterson me parece mais perspicaz. 32 Ibid., 168-69; Stott citando, Essentials, 316. 33 Ibid., 319. 34 Ibid., iv. 35 Estas sentenças são principalmente retiradas de Packer, art. cit, 23. 36 Ibid., 201. 37 Ibid., 250. 38 Ibid., 320.39 |
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